sábado, 20 de outubro de 2012

O menino e o político


O menino morava no mato.
No meio dos matos, porque eram vários matos
e várias distâncias.
Moravam o pai, a mãe e o menino.
o pai se chamava pai
a mãe, mãe
e o menino, menino.
O vizinho também se chamava vizinho
porque só tinha um.
o cachorro também era cachorro
e assim a vida seguia.
                                          Na economia dos nomes.
                                          A vida quase extinta
 
                                          a comida faminta
 
                                          e a palavra rara
                                          quase calada.
Na casinha de barro no meio do mato
só havia um lápis
por isso o menino tinha que inventar sua poesia
para que as palavras não acabassem antes do fim da linha.
O menino transgredia as palavras
escrevia com o dedo
nas nuvens
escrevia com o joelho
nas pedras
e com os olhos
no céu
 
ele fazia poesia fora do papel
E a terra o escrevia no barro
porque as palavras ali eram poucas
e porque eram poucas
o cachorro resolveu morrer
assim como fez o gato, a galinha e a mosca.
E com o passar do tempo as palavras iam morrendo
secando
sumindo
 
O pai e a mãe andavam preocupados
mas evitavam falar.
E na mudez mais seca vivida no mato
 
o menino ainda fazia poesia.
Se as palavras fossem fartas
e mãe chamaria o menino de maluco
de desordenado
de mau das ideias, mas o silêncio seguia.
E nesse tempo de silenciamentos
a casa de barro, no meio dos matos,
conheceu o político
era um homem alto e bonito
e cheio de palavras
chegou em boa hora
a mãe já estava quase morta, mesmo sendo uma palavra pequena
 
O político trouxe palavras e mais palavras
fartura sobre a mesa
todos se deliciaram
a casa estava cheia de promessas políticas
e promessas era uma palavra que o menino desconhecia.
Todos estavam felizes.

O menino com os olhinhos brilhando
e as ideias cheia de ideias
pediu a capa preta do super-herói político emprestada
o político riu,
isso chama-se paletó, para que você quer menino? – disse.
eu quero voar pelo céu e molhar o mundo com as minhas poesias
assim como você
que voou até aqui e nos molhou de palavras.
O político riu ainda mais e foi embora.

apesar das palavras do político
a mudez permaneceu 
 
e a seca secou.

Depois de um tempo o pai disse, mesmo sabendo que aquelas poderiam ser suas últimas palavras:
político é um animal que em quatro em quatro anos vem se reproduzir no mato.

O menino cresceu
virou um pequeno agricultor
planta e inventa
 palavras
virou poeta.

Pena que ele não pode voar sobre esse mundo afora.

Nenhum comentário:

Postar um comentário